Era tudo tão branco e gelo, B. (será que ousarei um dia escrever teu nome inteiro? Nada me impede -- mas nada me impele).
Se eu ousasse mergulhar no meu inconsciente recolhendo pedacinhos de símbolos perdidos na minha forçada racionalidade, poderia dizer-te que me descobri frígida -- ora, tanto gelo, tanto frio e tanta neve... Porém, como poderia o inconsciente ser traído por minha declaração no teu ouvido?
No sonho, eu trabalhava em uma emissora de TV. Tudo muito branco ou cor de gelo sujo. E lá fora, tanta chuva.
No sonho, retirei-me para uma sala de fumantes, igualmente branca, com mesas gelo-sujo, onde estavam três mulheres descoradas e desbotadas, que mal me notaram.
Parei-me a olhar pela janela enorme de vidro, vendo que agora nevava, forte, grossos flocos caindo pesados no chão branco sujo.
E vieste então.
De repente, estavas ali, tu, a única coisa colorida, quente e macia, e me prendias no conforto acolhedor do teu abraço longo de corpos unidos inteiros. Um abraço desses de ficar a vida toda.
E me apertavas e me dizias em tom urgente no ouvido:
-- Me dá um motivo.
E eu te dizia, em tom insistente:
-- Eu sempre fervi. Eu sempre fervi!
Ah, B., pudesse esse ser um motivo válido para esqueceres que procuras uma praia onde o sol sempre brilhe... Pudesse eu substituir esse calor que buscas pela febre que sempre houve em mim... Pudesses tu ser esse calor e minha única cor, num mundo sujo (pelo menos, branco...)...
Quase nem ousei confessar-te meu sonho, porque a modéstia sempre me impediu de te dizer que ainda tenho febre. A humildade dos meus sentimentos não colaborou para que eu te exigisse, te puxasse e te pusesse concreto nos meus braços, não etéreo e onírico.
Enquanto o gelo e o branco sujo varrem minhas noites, tu procuras a praia, numa busca incansável do paraíso onde talvez tudo ferva.
Mas não eu.
Ali.
Era só isso o que meu tantinho de coragem queria te falar. Que ontem à noite me abraçaste. E que entre os abraços últimos, nenhum teu foi o primeiro. E mesmo assim, me confortas, porque te sinto, te cheiro, te pressinto sempre em mim, com a saudade que temos de quem não vemos há vidas inteiras. E que talvez só reencontremos em outras.
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