27.6.05



Sempre tive uma inveja danada das mulheres daqueles homens que, aos domingos, se põem a cortar a grama com um desvelo de mãe que cuida a cria. Terapia. Obrigação. Ginástica. Um modo de liberar a tensão (se lá dentro o fedelho berra, a tevê chateia, a casa rescende a cebola e alho e o domingo se esvai em monotonia, não importa).

Sempre tive inveja das mulheres desses homens que cortam grama aos domingos.

Ou consertam o telhado.

Ou constroem um murinho que só serve para, depois, encher de vasinhos que logo os gatos derrubarão (certo, o cão não entrará, mas a sujeira não diminuirá por causa dos tijolinhos unidos no fim-de-semana).

Sempre fico observando, com uma inveja mal-disfarçada, esses homens domésticos, domados, treinados, pacatos, que colocam seus músculos em ação para ajeitar o ninho.

Um homem de avental me atrai, mas se está ao ar livre, fazendo do cortador de grama sua Ferrari, com o empenho de um Schumacher, valha-me Deus.

Até Brad Pitt, em “Kalifornia”, todo enlameado, suado, feio de propósito, cavando uma cova para enterrar o coitado do locador de seu trailer em frangalhos, me atrai barbaramente.

Assim, quando Mr. B. me liga do outro lado das Américas, em pleno verão norte-americano, e me diz que fez uma pausa em sua ingrata tarefa de arrancar toda a grama para substituí-la por uma espécie mais macia... Quando conta que suas unhas estão pretas de terra... Que está todo suado...

Deixo de ouvi-lo e até sua grande conquista no cinema vale muito pouco (para mim).

Digo-lhe que naquele instante, naquele exato momento, eu daria tudo para pular em suas costas suadas, para sentir nele o cheiro da terra.

Ele ri.

Diz que, pelo andar da coisa toda, só terminará em meados de 2007.

Digo-lhe que até lá junto dinheiro para surpreendê-lo.

E ele responde que, então, passará o tempo todo cavando e olhando por sobre o ombro na direção do portão.

Quem sabe?

Quem sabe uma selvagem, uma amazona louca por homens rústicos, ansiosa por homens terrosos, naturais e mansos, não venha montá-lo um dia?

Enquanto minha grama cresce e só é cortada por quem é pago para isso (que sem graça, que coisa sem sex-appeal), vou rezando para chuva e sol, chuva e sol, lá looooonge, e a cada fim–de-semana, eu o imaginarei, a partir de agora, nesse quadro curiosamente sensual.

Cortar grama tem lá suas recompensas.

25.6.05

Hora do Almoço

Tira daqui esse arroz-com-feijão!

Me traz um prato de ficção

e um copo de inspiração.

Me traz, de sobremesa, paixão,

Um potinho de emoção,

recheado de tesão.

20.6.05


Não me esqueças.

Se me esqueceres, porém,

que o vento que varre tua mente

leve tanto que te deixe vazio,

ansiando por algo que perdeste

e te faça procurar em alguém

um pouco do que tiveste de mim

19.6.05

De tudo o que foi dito
(bendito)
De nada esqueço
(padeço)

18.6.05

Dizes que te vês entrando nos meus sonhos.

Então me diz: por que porta tu sais, para que eu a mantenha sempre aberta e com uma vassoura escondida atrás dela?

12.6.05

“Only love can break your heart

try to be sure right from the start

What if your world should fall apart?"

(Neil Young)

Existe maior bobagem do que tentar garantir, desde o começo, que o amor não nos partirá o coração?

Neil Young fez minha cabeça, e em algumas músicas (The Needle and the Damage Done, My My Hey Hey) ainda faz, mas hoje percebi a besteira que ele diz na letra de Only Love Can Break Your Heart.

O mundo da gente sempre desmorona, quando nos apaixonamos e alguém nos parte o coração. Isso é certo, inescapável. Não há certeza no amor (e como diria o Stevie Wonder, “All in Love is Fair”) e querer garantias é tolice.

Talvez não caiba a mim dizer isso, uma vez que provavelmente eu possa ser classificada, em uma escala de 0 a 10, como um 7 ou 8, em termos de ter medo de amar – e nem foram muitas as vezes em que tive de juntar os caquinhos do meu coração. Entretanto, sou daquelas pessoas que, embora com medo, arrasta um trem para viver paixões. Dane-se, se houver dor. Dane-se se durar pouco. Dane-se, se nunca é Mr. Right que aparece na minha frente. Não existe o “Amor Certo”, nem o amor ideal. Existem amores possíveis.

Acredito que devemos, sim, tentar garantir que não estamos fazendo a pior escolha possível, desde o início. Isso sim. Mas não devemos nos cercar de muros. Os muros tornam impossível a escalada de alguém até nossos sentimentos, até nossa alma.

Já fui impenetrável, mas aprendi que o mistério que existe em nossas almas nunca transparecerá totalmente, de modo que deixei de fazer charme e hoje revelo o que há para revelar – sempre serei um mistério, tanto para mim quanto para o outro –, sem medo de me expor.

“Apenas o amor pode partir teu coração” – mas experimenta não amar, para ver como o coração vira pedra, inquebrável e inflexível, dolorido mesmo pela rigidez que impuseste a ele por força dessa “musculação”, deste exercício idiota de controlar tuas emoções.

11.6.05



DIGA NÃO

... a pessoas indiscretas
... relaxadas com o próprio corpo, sujinhas e fedidinhas
... a quem acha que ter arma em casa é proteção
... a homens abusados
... a quem diz que não gosta de crianças
... a mulheres que disfarçam o que são, por usarem aliança
... a parasitas, seres que não constróem, só usam e consomem os recursos do planeta, da família, dos amigos e parceiros
... a presidentes de país ignorantes, machistas e metidos a bem-humorados
... a revistas de fofocas
... a analfa
betos musicais e às rádios que os tocam
... a casas sem livros
... à falta do senso de cidadania
... ao há
bito de achar que algo muda se não se faz nada
... àqueles que preferem não ir ao médico para não sa
berem que estão doentes
... àqueles que, estando doentes, não querem sa
ber o que têm
... àqueles que sa
bendo o que têm, preferem não se tratar
... ao álcool em demasia
... à arrogância

Diga NÃO à idéia de passar pelo mundo e não fazer diferença.

Você PODE.


7.6.05

Oh, good, Mister Maslow,

agora que já satisfiz minhas necessidades de nível inferior – agora que estou alimentada, aquecida, segura, com meu trabalho muito satisfatório, com saúde e amigos que adoro, resta-me confirmar sua teoria.

Agora busco atender a uma necessidade superior.

E o que é?

A-M-O-R.

(depois desta, resta alguma?)

5.6.05

Uma Conversa

Ele chega atrasado e comento:

– Que bom que nunca vou casar contigo, Fernandinho, porque eu teria de me atrasar duas horas para ainda te esperar mais uma... estás sempre atrasado...

Zanzamos pelo shopping, cada um de nós recolhendo fios mentais de conversas inacabadas por e-mail ou telefone, muita coisa para ser retomada, pouco tempo para longas conversas significativas.

Pergunto como está seu coração.

Está vazio.

O meu também, eu digo.

Ele menciona um rol de interessadas virtuais que, quando vistas em carne e osso deixam a desejar.

Ele me responde, quando lhe pergunto por que:

– Uma mulher precisa ter a capacidade de pelo menos preencher uma hora de conversa interessante antes de ir para a cama e meia hora depois da cama.

Fico pensando...

– Além disso – ele continua –, não pode ser muito gorda nem muito magra. Deve fazer algo por sua vida...

Continuo pensando. Não lhe pergunto se eu preencheria os requisitos. Sei que sim.

Eu não preciso perguntar-lhe. E ele não comenta quando eu lhe conto que também tenho alguns “pretendentes” contados nos dedos, mas que uma vez que não transo (mais) com amigos e nem com amores do passado que querem jantar comigo e me jantar depois que casaram com outras (e quando supostamente eram apaixonados por mim), a situação fica difícil. Meu amigo e eu somos ocupados e não temos todo um mercado de corações livres de onde escolher um.

Ele não comenta, mas sabe que preencheria muitos dos meus requisitos.

Acontece que dos homens que mais admirei na vida, poucos (nenhum?) habitaram meu corpo – apenas minha mente e fantasia. Ele é um dos que ameaçaram entrar por uma porta que nunca se abriu completamente.

Meu amigo e eu chegamos a conclusões semelhantes. Que ele só conhece mulheres que querem se arranjar e que por isso nem começa nada com elas. E que eu não quero me arranjar com ninguém e por isso não começo nada com ninguém, porque não quero compromisso, mas também não quero aventuras.

Em nossas incongruências, meu amigo e eu nos encaixamos. Eu não lhe dou sexo, e ele não me dá romance. Negamo-nos graciosamente o que não seria espontâneo e aceitamos com elegância a honestidade de nossa tentativa de não nos enganarmos mutuamente. Ele nasceu para casar, mas detesta a idéia de que uma mulher o queira já com isso em mente. Eu não nasci para casar, mas detesto a idéia de que um homem não pense em mim como uma parceira em potencial. Sei que nunca serei parceira de ninguém, e aceito minha individualidade excessiva – com alguma dor pelo reconhecimento de minha insubordinação às emoções, mas aceito. Ele não aceita sua solidão, e vive à espera do que eu nunca procurei realmente – algo sólido, estável e tranqüilo.

Ele está atrasado para cumprir sua missão de bom filho, cuidando da mãe doente.

Eu estou com tempo para fazer umas comprinhas e depois rever amigos amados em um restaurante.

Eu o abraço apertado, lhe digo um muito obrigada de coração, e ele sabe por que, mas me diz que não preciso agradecer. Eu sei que não preciso. Ele é meu pai-irmão-conselheiro-amigo, talvez o único homem que sei que não me abandonará. Nunca. Nós não nos abandonaremos porque nunca prometemos nada um ao outro. E por isso mesmo estaremos disponíveis – essa é minha esperança, mais como um wishful thinking que uma certeza.

Naquele abraço eu agradeço por um favor que ele me fez e que naquele dia eu paguei, mas ele sabe que sou grata por muito mais.

Duas pessoas que não tinham por que sequer ter se conhecido. Duas pessoas que não se amariam se tentassem ter um romance. Mas duas pessoas que se amam mesmo assim, acima e além de tempo, espaço e circunstâncias.

Redescubro-me sempre, refletindo-me como um espelho no meu amigo.

Ele vai embora, com pressa.

Eu ando devagar, compro brincos, colar, pulseira, fumo um cigarro na frente do restaurante uruguaio olhando a noite linda e estrelada, morna em pleno junho no Rio Grande do Sul. Sorrio sozinha, ainda com o calor de um afeto real por este anjo em minha vida. Então, discretamente, coloco mais uma gotinha de perfume, piso sobre o cigarro e entro decidida no ambiente iluminado onde sei que verei mais rostos que acendem em mim o prazer de estar viva.