5.10.05

Jorge,

Hoje acordei pensando no dia em que perdemos tantas horas e, em vez de fazermos amor, discutimos sobre McCartney ou Lennon, argumentando sobre o nosso preferido, escutando horas e horas e horas de Beatles para tentarmos convencer um ao outro de que um era mais digno de nossa admiração que o outro.
Não posso evitar a sensação de que deveria te catar por um dos cantos deste mundo (não que eu não tenha tentado – simplesmente não te encontro mais), fazer-te sentar novamente – agora não numa cadeira de vime, uma das duas únicas que eu tinha na sala do meu primeiro apartamento – para que ouvisses comigo as bobagens que o McCartney andou aprontando.
Jorge, será que estamos todos ficando velhos demais, inclusive o Paul, bem mais que a gente e mais afastado da realidade musical?
Quando varamos a noite, eu e tu, e fomos até as três da tarde sem fazer amor, sem almoçar e sem mais nada, hipnotizados pela gigantesca afinidade que tínhamos, eu defendia o McCartney e tu dizias que ele era banal. O gênio era o Lennon – e contigo praticamente todo mundo concordava.
Agora concordo eu.
Será que o Paul está precisando de grana?
Não creio.
Mas como explicar que seu “Chaos and Creation” tenha quase nada de caos e quase nada de criação? Quase que apenas “Too Much Rain” passa pelo crivo de qualquer coisa. A voz já vacilante do Paul vem cantando todos, todinhos os bordões com mais de trinta anos de idade. Onde estão arranjos incríveis como os de “Band on the Run” (tudo bem, o George não está tocando mais nada na Terra, Ok, impossível querer sua guitarra mesmo)? Onde estão, ainda assim, as letras que, embora simples, eram tão lindas?
A última coisa mais ou menos nova que ouvi do McCartney e gostei nos últimos anos foi “Vanilla Sky”. Depois disso, o cara internou-se em sua poltrona preferida, não ouviu mais música e agora, não sei por que, achou que precisava lançar um álbum descartável com todas as baboseiras batidas que não convencem mais.
Pensando bem, Jorge, acho que faríamos melhor se desligássemos o McCartney das nossas vidas e usássemos aquelas horas todas para fazermos o que precisávamos ter feito tantos anos atrás (mas também, eu não estaria lembrando de ti se apenas tivéssemos feito amor, não é não?). Desta vez acho que precisaríamos esquecer os Beatles para sempre.
Eu nem te perguntaria por que, afinal de contas, nunca explicaste nada quando disseste que eu deveria ter te dito que era canhota desde o primeiro momento em que nos vimos, já que isso mudaria totalmente a tua maneira de me ver. Nunca entendi e talvez eu continue tão lelé da cuca quanto naquele tempo. Mas juro que não tanto quanto o Paul e já não perderia mais tempo discutindo música contigo. Contigo, não.

2 comentários:

Anônimo disse...

Já te falei que meus amigos me chamam de "Jorge"?

Hua HUa Hua!

Anônimo disse...

Tu tens a capacidade de me fazer rir, Marcos.

Hello, Jorge ;-)