5.4.11

Minha mãe foi pro Japão

Nos primeiros dias após a perda de minha mãe, inventei a fantasia autoprotetora de que minha mãe havia ido morar no Japão, bem longe, no interior, sem Internet...
Quando a dor ameaçava me estraçalhar, eu brincava, comentando: "Mas que droga, ela ter ido pro Japão assim, de repente..."
Minha mãe foi pro Japão.
E então vieram o terremoto e o tsunami, o vazamento nuclear...
Pobre da minha mãe.
Tive de tirá-la às pressas do Japão num avião de sonhos, improvisado, particular, só pra poder levá-la para a Rússia.
Acho que lá não haverá nenhum desastre natural e ela poderá viver em paz, embora tão distante de mim...

(aos desavisados: isso não é um atentado contra a memória de minha mãe. É o tipo de humor que ela apreciaria, como quando fomos uma vez ao cemitério e, em um dos corredores, vimos uma lápide toda preta, de vidro, brilhante, sem qualquer inscrição e, ao um comentário meu de que só faltava mesmo o controle remoto, porque já haviam providenciado a TV de plasma, ela caiu na risada e foi ampliando a brincadeira - e lá fomos nós, descendo as rampas do cemitério desde o sexto andar, rolando de rir, com vergonha do ataque absurdo de apreciação pela vida num lugar tão esquisito)

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