11.11.10

SÓ POR HOJE
eu não vou chorar
ainda que aquela que mais me conhecesse e, por isso mesmo, tivesse por mim um amor brilhante, claro e inabalável, não esteja mais aqui e me pareça - não sem razão - que neste mundo quem ainda devesse me amar não me conheça e, por isso, não possa me amar - apenas questionar quem sou e inventar sua própria realidade de quem nunca fui.


Dizem que o tempo tudo cura.
Eu não sei.



23.10.10

"Vida normal" é algo excepcional.
Hoje faleceu minha ex-cunhada, que visitou minha mãe no hospital e, dias depois, teve um AVC. Passou mais de dois meses em estado vegetativo.
Deixa um filho de 17 anos.
E dois outros, adultos.
Deixa a vida sem saber sequer o que aconteceu para ir parar no outro lado. Sem tempo de se preparar. STOP!, diz Deus, e a deixa sessenta e poucos dias mais ou menos à espera da passagem.
Vida normal é algo excepcional, que devemos agradecer a cada minuto.
Tédio?
Isso não existe.
Eu já disse aqui, e repito: tédio é outra palavra para a ausência de catástrofes.

11.7.10

Estou muito triste, mas estou em paz.
Não há como não chorar.

* * * * *

Amigos que eu achava que tinha, descobri que nunca tive.
Pessoas que eu desconfiava serem boas, mostraram-se maravilhosas.
Algumas mágoas, tentarei não levar para sempre. Perdoarei, eventualmente - e descartarei essas pessoas da minha vida, porque não servirão para nada, se em um momento de tanta dor não se manifestaram.

* * * * *

Li hoje, em um site de Testemunhas de Jeová, que a dor da perda vem em ondas.
Por enquanto, é Tsunami.

* * * * *

Há amigos a quem ainda não contei que perdi minha mãe.
Não contei porque quero poupá-los das minhas lágrimas.
Prefiro chorar sozinha.

* * * * *

Sei que um porta de afeto se fechou, mas deu lugar a que muitas outras se abram.

* * * * *

Renate e Mônica, como vocês foram queridas! Colegas de tradução, mulheres, seres humanos sensíveis, amigas.

* * * * *

E em tudo isso, eu estaria um pouquinho melhor se essa m* de tala gessada não me impedisse de limpar minha casa, lavar sozinha os cabelos, lavar louça e me vestir direito. Acho que segunda-feira ponho o gesso - com 5 dias de atraso - ou encaminho a cirurgia, que a tomografia mostrou ser necessária, porque uma lasca de osso da fratura foi parar perto do dedão, bem longe da fina linha reta onde o osso do pulso se partiu. Diz o médico que se não operar, ficarei com limitação de movimentos do pulso.
Tudo isso porque a pessoa que ficaria com minha mãe no hospital domingo passado não apareceu, meu irmão foi até lá mas não queria (ou não podia) ficar e eu, na pressa, na preocupação, no cansaço (turnos intermináveis de 12 a 15 horas no hospital, todos os dias), fui descer a escada para a lancheria após 4 horas de fome junto ao leito da mãe, tropecei e, para evitar uma queda muito feia, levei os braços à frente e no mesmo instante senti a fratura no punho direito, clec clec.

9.7.10

Mamãe, minha bela,

Pouco mais de vinte e quatro horas atrás, te colocamos ao lado do teu filho Edinho, para sempre.
Brincávamos que "tínhamos onde cair mortas", por seremos as "felizes proprietárias" de um jazigo em um cemitério.
Caíste, pelo câncer.
Mãezinha, doi, doi, doi, doi, doi, doi.
Meu coração está quebrado.
Minha alma, em frangalhos.
A lista de "nunca mais" só cresce.
Nunca mais teu sorriso ao me ver, nunca mais tu me chamando de "negrinha" (a única pessoa no mundo que me chamava assim), nunca mais tu me avisando que os moranguinhos que plantaste estão no ponto para eu comer, nunca mais tu colhendo uma rosa linda para me dar, nunca mais tu fazendo palavras cruzadas na mesa da cozinha, nunca mais tu lendo teus romances bobinhos, nunca mais tu dormindo de óculos e luz acesa, nunca mais tu abrindo os braços e me chamando de "minha bela" quando eu chegava pra te ver, nunca mais, nunca mais.
A lista de mistérios só cresce: como falavas em espanhol perfeito em teus delírios, se nunca falaste espanhol? Tu vias ou não vias teu pai e tua mãe, quando a morfina alterava teu estado mental? Por que pediste umas vinte vezes "Liga pra Ingle", se isso nem é nome de gente? Como, ao delirar, falavas como uma professora primária dos anos 40 (todos os "r" no fim dos verbos, todos os pronomes, tudo certinho como não era tão comum falares?)...
Mamãe, peguei trauma de cheiro de suor humano. De urina.
Mãezinha, como conseguiste acordar da dose contínua de sedativo que te aplicaram para não sofreres, como conseguiste essa façanha, só pra ficares uma manhã inteirinha conversando lúcida comigo e me dando adeus?
Eu te disse: "Não te preocupa comigo. Posso cuidar de mim, de ti e de mais um exército inteiro, ninguém precisa me achar desamparada".
Sei que falei a verdade. Eu sou forte. Tão forte que me assusto com isso.
Mas, mãe, esse amor que tenho por ti doi tanto que nem sei dizer, e tenho chorado muito.
Hoje chorei ao acordar, porque lembrei do "meus pêsames" recebido daquele que teoricamente deveria ter chorado muito e se mostrado sensível à minha dor e ao teu sofrimento, mas que mandou a mãe dele representá-lo, porque ele estava "viajando". Esse mesmo cara colocou no seu MSN que havia perdido uma grande e antiga amiga, quando sua *cachorra* morreu. Temos menos valor que cães pra quem só nos passou a perna, mãe.
Hoje eu não pude sair na rua, nem pra ir colocar o gesso no braço direito que está com tala desde que quebrei o punho na queda da escada do hospital domingo passado (e tu disseste, fraquinha, na segunda-feira, ao me ver: "toda quebrada..."). Não pude sair porque meus olhos estão inchados demais, uma vergonha.
Eu vou chorar por ti pelo resto da vida, como ainda choro pelo Edinho que partiu 18 anos atrás e pelo meu pai, que foi embora 13 anos atrás. Por ti vou chorar mais.
Eu sei que serei feliz. Tenho certeza. Tu não criaste uma filha que nasceu pra chorar.
Só que vai levar um tempo ainda.
Hoje fiz uma coisa aqui, outra ali, e as horas passaram.
Passarão, todas elas, até o dia em que o mundo não precisar mais de mim e Deus me chamar como chamou a ti.
Aí te darei aquele abraço apertado que fiquei cinco meses sem poder te dar (doía tudo em ti).
Minha bela, elegante, bondosa, prática, caridosa, talentosa mãe,
FICA COM DEUS.

UM ANO ATRÁS...

Éramos felizes, mamãe (e sabíamos disso)

26.5.10

E ela fala dormindo.
Conversa com pessoas invisíveis.
Conta coisas. Escuta. Responde.
Pelo menos, tem companhia.
Faltam poucas horas para a minha mãe internar-se.
"Exames", dizem os médicos. Tons of tests.
"A internação pode durar três dias ou três meses", dizem eles. E ela lhe dá aquele olhar meio perdido, meio "eu sei tudo", no meio dos seus ai-ai-ais.
São tantos ai, ai, ais.
Cinco dias na minha casa, na minha cama, e milhaaaaaaares de aiaiais depois, eu já nem sei direito quem sou.
Sou uma dor imensa.
Uma solidão que não pode ser preenchida.
Sou a que se perdeu de si.
E segue às cegas por aí, dando de cara com o Destino.

10.5.10

Sou uma filha pequena de Deus.
Pequena. Bem pequena.
Muito pequenina.
É bom lembrar disso, porque filhos pequenos têm muito a aprender com a vida e com as quedas.
Eu tenho.
Lição de humildade pra lá de corretiva, ver a mãe chorando de dor e não poder fazer mais que comprar remédio e dar o ombro pra ela molhar.
E aí você pergunta: "Mas pô, que merda, só acontece coisa ruim na tua vida ultimamente?"
Ah, não.
O Banco diz que minha pontuação (o índice de confiança no banco em mim) é hipermegaalta e me dá um cartãozinho com chip e um aparelhinho que libera tudo, como se eu estivesse dentro do banco (agora fica mais fácil eu gastar tudo o que ganho no mesmo dia, pagando contas, já que meus limites de transferência acabaram com o desbloqueitor dinheireitor Tabajara deles). Além disso, aumentam absurdamente meus limites (compras parceladas, cheque especial, limite para empréstimos instantâneos). Valeu, Banrisul. Tô feliz da vida porque posso afundar le-gal, com essa tentação toda.
Corrigindo: estaria feliz, porque a geladeira e a mesa de jantar novas ficam pra São Nunca, agora que eu gasto uns 500 reais de remédios, mais uns 400 para alguém dar uma cuidadinha na mãe quando não estou com ela, mais isso, mais aquilo e mais aquilo outro. Mas ó: eu venderia a alma, se isso ajudasse minha mãe a ficar boa.

Ah, e pra não dizer que na real, na real *mesmo* nem tudo anda ruim: comi bergamota (mexerica) bem docinha, ao sol (antes de praticamente quebrar minha rótula deixando a estufa cair sobre a minha perna).

E arranquei mato. Ô, como adoro arrancar mato dos canteiros de qualquer pessoa, já que eu não tenho canteiros próprios.
E aí eu vou cuidar da mãe e levo meu modem 3G da TIM (TIM MATA, OTÁRIO).
Com crédito, tento 6 vezes ativar o pacote dia, que custa 10 reais por 24 horas.
Não consigo, como da outra vez. Aparece mensagem de "serviço indisponível" no software de conexão.
Consigo conexão avulsa, 1 real por cada mega que baixo.
Alguns minutos depois, tento ativar novamente o pacote dia, e daí dá a mensagem esperada, para eu aguardar confirmação.
Que não vem.
O que vem é uma mensagem de "Você não tem saldo suficiente para esta operação".
Resumo da ópera: a TIM está roubando os clientes, "saindo do ar" para ativar 250 MB por 10 reais, mas aceitando que a gente conecte a 1 real por MB. E, obviamente, quando a gente já não tem mais 10 reais porque gastou 6 reais em conexão avulsa por necessidade de trabalho, aí a operadora FAZ DE CONTA que iria permitir a ativação, mas aí a gente NÃO TEM MAIS SALDO, então não dá mais pra conectar pelo plano dia, anyway.
Como eu sou otária.
A propósito do gato com tumor: o Negão (o meu gato pretão) morreu.
Segunda-feira ele esgotou a sua sétima vida (ele devia ter nascido americano, já que lá gatos têm "nine lives" (nove vidas).
Não foi o tumor que o matou.
Foi insuficiência renal, que causou encefalopatia.
Chorei, chorei, chorei, chorei.
Aproveitei pra chorar pelo Negão e pelo resto das coisas que doem.
Chorei inclusive pelas pessoas estúpidas que no domingo dizem, lá do hospital veterinário que "o Negão tá bem, tá comendo e se movimentando muito" e na segunda ligam pra dizer que se enganaram, que o Negão morreu e nem chegou a comer, em nem um minuto, que quem comeu e estava bem era um outro gato preto.
E agora o Kinim, meu outro gato preto, chora "muau muau muau" bem alto, hora sim, outra também, à procura do seu amigo que não existe mais.
Que saudade da minha vida de dois meses atrás.
Acordamos com choro, dormimos com medo.
Almoçamos precaução, jantamos desilusão.
Rimos da dor, choramos com o que devia fazer rir.
Está tudo errado.
E mesmo assim, está tudo como tem que ser.
Que seja.
O lado irônico de ajudar uma mãe doente é que ninguém *me* ajuda e, então, eu deixo cair a estufa tipo radiador, beeeeem pesada, sobre a minha perna e, principalmente, o meu joelho, quando retiro da caixa e tento virar o presente de dia das Mães de cabeça para baixo para ajeitar os rodízios.
Resultado: joelho esquerdo PRETO, muito inchadão e muita dificuldade para caminhar.
Mas não vou ao médico, não. Se for, ele enfaixa ou engessa, e aí não vou poder ajudar a mãe e mesmo sozinha ninguém vai me ajudar, se eu não for ajudá-la..................
Whatever you give a woman, she's going to multiply.
If you give her sperm, she'll give you a baby.
If you give her a house, she'll give you a home.
If you give her groceries, she'll give you a meal.
If you give her a smile, she'll give you her heart.
She multiplies and enlarges what is given to her.
So--if you give her any crap, you can expect a ton of shit.

(Found in http://www.netfunny.com/rhf/jokes/09/Feb/giving_woman.html)

3.5.10

Eu tenho um gato com um tumor nas costas que ficou cego e está no hospital.
Tenho uma mãe com tumor na clavícula que está em casa e sente muita dor.
Eu tenho amor (e pavor, em igual medida).

21.4.10

"And time goes by so slowly, and time can do so much...
Wait for me..." (Unchained melody)

O tempo agora se arrasta - e ao mesmo tempo corre.
Eu estou confusa. Por que, antes, os dias eram tão curtos e agora passam tão lentamente?
E ao mesmo tempo, por que passam, se é só para chegarem àquele em que o tempo vai parar?
Para sempre.
Estou desorientada. 
Totalmente perdida e o que sinto vontade de dizer é: "Não te esquece, tudo o que eu fizer é para o teu bem. Sempre foi assim. Não te esquece que eu te amo e se parecer que eu te traí, é porque não pude suportar teu sofrimento ao ouvir a verdade. Perdoa, mas pela primeira vez na vida não estou sendo sincera contigo, porque tu eras para ser eterna, e não te perdoo por não seres."

Mas serás, sim.

(palavras não mudam nada, mas talvez escrevendo eu me convença que minha etapa de Alice ou Pollyanna na vida realmente, definitivamente, acabou.)

Sinto a maior solidão do mundo (e eu nunca senti solidão).



19.4.10

Eu não conhecia na pele o significado da palavra desespero.
Agora, a cada minuto que passa, ela se incorpora em mim, mais e mais.
São pequenas coisas recordadas, como uma indagação brincalhona "Será que estarei viva em 2014, quando a Copa for no Brasil?", ou nossos planos de eu voltar a morar perto dela. É o amor existente há décadas, infinito, recíproco, generoso de ambos os lados, tolerante e encantador.
De repente, o mundo perde o compasso, e o tempo adquire outro significado.
Só o que se quer é livrar alguém da dor. O que se quer é não ser tão impotente.
E de repente, perdemos o chão e toda a nossa grande sabedoria espiritual sucumbe, varrida pelo horror e rebaixada a um amor que nada pode.
E a gente percebe que, enfim, acordou.
Que essa é a verdadeira dor.
Eu não quero acordar.
Não vou suportar.
“Ainda que eu ande pelo vale da sombra da morte, não temerei mal nenhum, porque tu estás comigo.” (Salmo 23.4)

21.3.10

As Rosas Não Falam

"devias vir, para ver os meus olhos tristonhos e, quem sabe, sonhavas meus sonhos, por fim" (Cartola)

Segunda-feira passada fiz aniversário e recebi um buquê de rosas vermelhas de alguém que nunca vi e sobre quem não sei nada.

Sei seu nome, e só.

Ele me admira por ouvir falar de mim, por ver uma foto minha. Fantasia.

Foi tocante receber essas rosas. E eu não costumo me emocionar com presentes que não demonstrem algum sacrifício ou um ato generoso da alma.

As rosas foram os dois.

As rosas não falam/simplesmente as rosas exalam/a bondade que existe em ti.

OBRIGADA.

Satisfação...

... é ouvir minha filha de 14 anos dizer: "Mãe, como tu és querida."

Dentre alguns elogios e tantos eu te amo, eu jamais havia ouvido minha filha dizer que eu sou "querida".

Não sei por que fiquei tão satisfeita.

Talvez porque em geral eu escute que sou:

mandona. preocupada. ocupada. consciente. ajuizada. sensata. carinhosa. correta.

Mas querida?

oooooooooooooohhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhh...

Adorei.

7.3.10

Reviranças

Esse blog tinha (quando ainda se chamava Sísifo's Place) um montããããão de visitantes. Não chegava a ser um sucesso na Internet (mesmo porque não é sobre Big Brother, sobre novelas, sobre pseudocelebridades, nem sobre iPad ou outra moda qualquer). Não chegava a ser uma coisa estrondosa (pra isso, eu precisaria falar em monossílabos aqui, precisaria escrever textos incoerentes e com gírias, palavrões e pornografia). Não era assim uma Brastemp, apenas uma modesta maquininha de lavar minhas ideias.
Mas o blog tinha uma contagem de milhares de visitantes.
Não tem mais.
Não quero contar números.
Nem saber quem vem aqui.
A não ser que seja por seus comentários sobre minhas ideias/textos/posts.
Melhor tirar da mente qualquer pretensão de ser sucesso.
Números não revelam qualidade, só quantidade.
Meu blog não conta visitantes. Não os rastreia. Não os investiga.

Sintam-se à vontade.
Nossa, eu tava com uma saudade do meu blog! :-)

VOLTEI

Eu tinha uma síndrome de Alice no País das Maravilhas.
Um complexo de Pollyanna.
Alice morreu.
Pollyanna cresceu.
Há uma mulher em mim.
Só isso.

SÓ?!

Ser MULHER é mais que a palavra.

SOU.

Sem Alice, sem Pollyanna e sem Príncipe Encantado.

Mas não sozinha,

29.3.09

Às vezes,
tudo o que se precisa
é que o outro saiba
que tudo que se precisa
é que o outro caiba
naquilo que se precisa.

Às vezes,

tudo o que se quer
é que o outro queira
o que a gente quer
que ele queira
o que a gente der
e queira se dar
se puder.

22.3.09

Damn you, copycat! (The chronophage)

Em 2005 eu criei um post chamado time-eater e, hoje, procurando por ele no google (que me levou até o Sisifo's Curse, que eliminei, mas ainda consta no cache), encontrei uma coisa que me deixou de boca aberta.
Inspirei meu post da época em um conto do Stephen King, em que um monstro de grandes dentes comia literalmente o tempo que ficava para trás (o Stephen King chamava "a coisa" de Langoliers, em Four Past Midnight, uma coletânea de quatro histórias fascinantes).
Agora (na verdade, no fim do ano passado), vêm o Stephen Hawkins e John C. Taylor com a novidade que mescla essas idéias.
Fascinante e assustador.
O site da BBC e outros chamam o chronophage de Time-Eater, a tradução literal do nome do bichinho. Um relógio que come o tempo e, pelo menos para mim, faz pensar no horror que é não aproveitá-lo direito.
Vou ter de pedir direitos autorais :-)

9.3.09


Tu me encontrarás nas palavras, na penumbra que te descrevi, nos poemas que não te escrevi (tudo já estava lá - os desejos, a vontade, a ânsia do inesperado - até que chegaste).
Tu me verás (ponto de interrogação), aparentemente me aceitarás, nunca entenderás.
Eu sou aquela que puxa fios de marionetes invisíveis e arma um teatro de ilusões e fantasmas para te agradar. Sou quem se despede curvando-se em mesura ante a tua beleza e, já na porta, ainda olha para trás - tu, miragem, continuas na minha frente (o tempo todo na mente) enquanto a porta se fecha.
Sou a mulher-menina, que cora ante a descompostura, pede desculpas sempre, rói as unhas e sente lágrimas nos olhos - mas puxa o vestido, incerta, dá um sorriso vacilante e se levanta, esconde-se e espera que tu a procures (se vieres, quando vieres, se quiseres, se te deres).
Sou a dos desencontrados desejos (por minúcias, às vezes), minutos contados de tua ânsia satisfeita - a minha, desatenta, se deixa levar por mais sonhos, pra te fazer suspirar.
Sou aquela que ajeitarás no meio dos teus pertences, misturada a tantos outros sussurros que não ouves. Tu fecharás a gaveta e me esquecerás, sem suspeitares que minhas letras sempre foram tuas (eu não sabia - sentia) e que me escorro líquida em teu corpo, minhas palavras expulsas no teu prazer.

19.1.09

Diário de Uma Mulher Comum - Capítulo XVI

Dez horas.
Acordo espontaneamente. Não é tarde, para quem só foi dormir às 6. Além do mais, havia faltado luz e o rádio-relógio pisca-pisca com um horário incerto e duvidoso. Não é aquela, a hora, mas já é hora de levantar, quando vejo que o celular tem hora precisa (e precisa?, quase não o uso).
Aliás, desde o momento em que desperto eu já começo a gastar.
Antes do café:
Ligar computador. Limpar a caixa dos gatos. Botar ração. Botar água. Dar comida pra tartaruga. Varrer em volta da caixa dos gatos (eu havia esquecido). Escovar os dentes. Lavar o rosto. Torcer pra chover. Botar água para esquentar.
Escrever email cobrando com todos os argumentos o cliente da Tailância que me deve há 65 dias. Não creio em más intenções. Que las hay, las hay, pero...
Tomar café enquanto vejo que o cliente JÁ respondeu (dez minutos!). Pretende pagar parcialmente.
Lavar louca de ontem.
Resolver se mesmo com dúvidas e dívidas eu compro aspirador de pó. Cansei de ver belos tapetes de chochê grossos de pêlos (não tem mais acento em pêlo, né?) de gato.
Tomar banho e ir ao shopping comprar ingresso pro show da Alanis dia 10 de fevereiro (antes disso, trocar de roupa três vezes - nada me satisfaz, mas na verdade eu não estou satisfeita é com o corpo que antes dos cinco quilos que ganhei de um ano pra cá, ficava lindo em qualquer roupa).
A-há! Peguei vocês.
Não é pra mim. Não vou ver Alanis. Não vou a show nenhum. É pra um colega de Brasília que me pediu o favor.
Comprar aspirador e ter uma idéia financeira ótima.
Passar no banco pra ver se a idéia financeira pode se concretizar.
Nope. Pra tirar empréstimo, preciso atualizar meu cadastro. Pra isso, preciso comprovação de renda. Se tenho trocentos clientes, mas pouca comprovação, azar o meu. Pode ser uma declaração de contador.
Em casa, ligo pra contadora.
Suspiro. Se eu fosse pedir recibo dos muitos para quem trabalho para pedir o empréstimo, também morreria pagando I.R. Então, sem I.R. e sem empréstimo.
Quando a solução é mais trabalhosa que o problema, fica-se com o problema.
Aspirar o tapete, agora pensando que foi bobagem não poder conviver com pêlos (sem acento?) de gato, já que estou duzentos reais mais pobre só pra ter tapete limpo.
Ver que o cliente da Tailândia não depositou minha grana (parcial) no Moneybookers coisíssima nenhuma.
Descer, comprar mais terra de gato, mais ração de gato, e esquecer de comprar o café, que precisava tanto quanto.
Pensar em ligar pra filha em férias com seu pai, mas desistir porque ela deve achar que sou um pé no saco, ligando de dois em dois dias. Ela? Não liga nunca.
Passar café com o que resta de pó. Preguiça de voltar à rua pra comprar mais.
Pensar em como pagar o resto do atraso do colégio da filha (felizmente, minha única dívida -- mas COMO incomoda!!!!).
Raciocinar que trabalho eu tenho. Só tenho que trabalhar mais ainda.
Ler email de um moço perguntando onde é que eu ando, e se nunca penso em amor.

Hein?

Ãh?

Amor é um troço assim meio colateral, que aconteceria se eu tivesse dois minutos para pensar nisso e ao menos uma hora por dia para dedicar a alguém. Amor é um negócio que pode -- ou não -- acontecer comigo, mas altamente improvável.

Enquanto isso, meu gato preto quase despenca de cima do roupeiro da filha (já sei: o aspirador servirá pra limpar a boneca Emília, sobre a qual ele acampa há 5 dias). Ele me vê, fica alucinado de paixão e quase se atira pro meu colo.

Miau. Te amo.

Puxa.

Ainda bem.

Melhor que nada.

10.1.09

Minha mãe ao telefone falando com meu irmão, enquanto eu escuto bem distraída. Diz ela:


- Ah, dona Maria está mal, é? E o que vão fazer?

Após uma pausa, ela diz:

- Mas por que tu não amarra bem apertado? De pé mesmo! Amarra bem, enfia num saco preto desses bem grandes e joga num canto, tu tem espaço, não vai atrapalhar ninguém!

Eu pergunto:

- Pra que fazer isso com a velha?

Ela cai na gargalhada. Como eu conheço bem os papos caóticos da nossa família, nem preciso perguntar nada, mas ela explica mesmo assim:

-- Ele diz que a dona Maria foi pro hospital e que está atrapalhado desmontando a árvore de Natal, que é grande demais e não sabe o que fazer com ela.

(pano rápido)

7.1.09


Eu tenho uns sonhos guardados em um baú.
Estão amarelando.
Tentei escrever diário -- em um caderno.
Doeu-me a mão.
Queria ter o cheiro do papel, o rolar da caneta, a tinta, minha letra.
O pensamento ficou confuso.
A mão, vagarosa.
A letra, trêmula.
A tinta, falha.
O papel, longo demais para pouco tempo e tanto a contar.
Como é que ponho um link na folha?
Como vou transmitir o sorriso sem um smiley?
Ah, cadê o copiar e colar?
Delete?
Puxa, vou ter de imprimir aquela foto pra colar ali. Com cola!
Oh, Deus, minha mão só tem uma fonte e é sempre em itálico!
"Bold" só tendo a coragem de escrever três vezes por cima da palavra.
Como é que minhas letras, todinhas iguais, sem recursos do teclado, conseguiam transmitir minha emoção, tempos atrás? Minha vida era feita de uploads maciços de sentimento, não de downloads de programas.
Os programas, eram os da TV. Que eu não via. Tinha muito a viver.
Audazes escritores de antigamente.
Mas também, não precisavam responder 50 e-mails por dia.
Nem deletar spams.
Nem tentar ignorar papo-furado no MSN.
(Nem pagar a banda larga e a conta de luz)
A vida anda acelerada demais para saudosismo.
Bom dia, notebook -- feito de componentes eletrônicos, não de polpa de árvore.