18.1.05

Dinheiro se traduz como...

Eu sou o sonho de qualquer patrão (acho que sempre fui).

Sou o tipo de pessoa que, frente a uma oferta de trabalho, vai apresentando credenciais, dizendo que está sempre disponível, que aprende com facilidade, é esperta, rápida e bem-disposta... e que, finalmente, já com um pé para fora da porta, volta-se e pergunta: "Mas qual é o salário, mesmo?"

Se me perguntarem se prefiro ganhar cinco vezes mais trabalhando com pessoas intolerantes, competitivas e egoístas, com egos que exigem carregadores ou receber o suficiente para pagar as contas (ou quase nem isso) para trabalhar na companhia de pessoas bem-humoradas, solidárias, carinhosas e parceiras, vou sempre optar pela segunda alternativa. Para mim quase não há como escolher.

Donde se conclui que ainda não fiquei rica e dificilmente ficarei.

Prefiro a simplicidade de um sorriso que a complicação da burocracia.

Não sou tola e conheço meu valor, mas valorizo muito coisas que nem todos colocam na balança, em outras pessoas e nas parcerias que formam.

Provavelmente já servi de motivo de riso para gananciosos mal-humorados que ganham mais que eu -- e rir dos outros é praticamente a única fonte de diversão para muita gente --, mas continuo sorrindo por dentro e por fora, em paz comigo mesma.

Por isso, quando tenho a possibilidade de ganhar mais dinheiro que o "normal", como talvez aconteça em breve com trabalho monstruosamente difícil (para alguns), desconfio.

Where's the fun of it?

Cadê a diversão?

Porque parece que, na mente de muitos, ganhar o pão e divertir-se ao mesmo tempo não são coisas que possam ocorrer simultaneamente. Parece que até para mim a possibilidade de ganhar mais significa que parte da diversão do trabalho e do contato humano terá de ser eliminada.

Descubro a resposta dentro de mim. A diversão para mim (incompreensivelmente para outros) é o desafio. O tema da tradução é dos que mais gosto. A diversão está em ter sido escolhida no meio de candidatos do mundo inteiro (literalmente). A diversão é saber que vou ganhar bem traduzindo o que amo. E me cercando de gente querida, que vira a noite e ainda ri, toma Coca-Cola e aspirina pra espantar o sono, bate cabeça sobre o teclado e sente que vai entrar em coma de cansado -- e mesmo assim, acha isso lindo.

A diversão, para mim, é em meio a este projeto traduzir para amigos ganhando cinco vezes menos, uma ou duas horas por dia, do que o projeto me pagará. Porque esses amigos eu não dispenso. Dinheiro some. Amigos é que não podem sumir.

Nasci tradutora.

E tendo nascido tradutora, nasci um pouco artista. E sendo um pouco artista, o que menos conta para mim é ficar rica de grana. Sou rica de contatos, sorrisos e carinhos. De possibilidades, projetos e criatividade. De trocas humanas, de coisas boas dadas a este mundo. De amor pela vida. Se com isso vier muito dinheiro, será o melhor de dois mundos.

E aí me pergunto se situações ideais podem tornar-se realidade.

Mas isso é muito complicado para mim. Entra na filosofia e prefiro ver na prática se o ideal e o real podem se encontrar. Quem sabe não acho a solução mágica?

6 comentários:

Anônimo disse...

A solução mágica não é. Você mesma já solucionou e a medida é dada por aquilo-que-dentro-do-coração. Algum som sai, algum preço a ser pago, alguma barganha, troca. No final o que vale é a procura: por solução, meio-termo, gozo. Somos o meio. Beijo.

Anônimo disse...

Um amigo, Conselheiro de Carreira, me ensinou o seguinte: devemos alimentar o corpo, o espírito e a mente. O corpo com dinheiro, o espírito com religiosidade e a mente com cultura -- ouro, incenso e mirra. Sendo esta, usada para embalsamar os mortos, acredito que a cultura nos torna perenes. Eu não gostaria de passar pelo que Lima Barreto passou. Vamos fechar contratos espetaculares, sim. Mas sem pisar no pescoço de ninguém, lição que aprendi com a nossa querida Cássia Eller. Era isso. Lógico que, aceito réplicas.
Márcio

Anônimo disse...

Por favor, preciso urgentemente dessas respostas:

-É possível traduzir, depois de ter passado a vida inteira copiando e trancrevendo,literalmente?

-O que a relação espaço-tempo-lugar tem a ver com o ato de traduzir e escrever?

- Porque não aprendemos isso na escola?

- E qual é a contribuíção dos jornalistas, tornar nossa vida cada vez mais "real"?

Anônimo disse...

Cara, o que esse Marcio escreveu é tudo! Vou roubar... É mais ou menos o que eu acho e o que eu ia te dizer. Eu acho sinceramente que se pode ser os dois. Não quero ser rica, quero ter dinheiro suficiente para um vida confortável, só que nowadays isso é ser rico. Estou em muitas dificuldades, e aprendi a importância do dinheiro num mundo que é escravo dele. No way out. Eu qq curso que eu der aula, ganhando bem ou mal, tenho os mesmos aborrecimentos. Então, que eu ganhe bem! It´s much funnier, fazer o que se gosta e ganhando bem. Pra mim, os 2 tem q vir juntos. Imagina se perde a graça, ficou maluca?
Tb nasci dançarina, mas não posso fazer arte pq ela não me ajuda a viver nesse mundo... Não não não, discordo totalmente de vc. Se tive meu galo roubado, é pq não tenho dinheiro pra fazer um muro no terreno aqui de casa. Se minha mãe se mata de trabalhar arrastando caixas de cerveja como um peão de obra, é pq eu não me sustento e não posso nem ajudá-la, com o meu curso "superior" e as minha aulas de inglês que só rendem status, e mais nada. Não acho q seja uma solução mágica não, tudo é possível e real. Tenho conversado com professores que me dizem isso, e eu vejo... Professores não ganham mal, mas o início da carreira é uma merda! Cansei de fingir que vivo bem sem dinheiro, pq não vivo. Assumo isso. Ele não é o principal, mas ajuda e muito.
Bjs.

Anônimo disse...

Patrícia:

Não estou falando que prefiro passar fome. Felizmente, os tempos piores passaram, mas não sabes, não tens nem idéia do quanto a tua vida agora se parece com a minha com a tua idade. Eu me vejo em ti. Quando contas da dança, de tudo, sinto-me em ti. Já fui como tu. Um dia serás como eu (mas em versão melhoradíssima. Estou falando de, em vez de ganhar bem, ganhar muitííííííssimo bem. Troco a última pela primeira na companhia de pessoas doces, mas não a primeira por miséria na companhia de sorridentes alienados, né? :-)
Concordo que é difícil sorrir passando fome. Mas mesmo passando fome (e já passei) é possível encontrar alegria de viver. E isso eu teimo.

Anônimo disse...

Aaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaahhhhhhhhhhhhh sim.... Pode teimar pq eu tb teimo. Mas que é difícil... Pô mas ganhar bem eu não troco não! Pra viver com "sorridentes alienados" não! Bjo!