11.9.04


Me deixa acabar com essa luz, estourar todas as lâmpadas, mudar para onde não haja essa claridade toda, voltar no tempo, estar onde já estive com certeza tantas vezes em outros tempos - outras Dayses, quem sabe Maries, Jacquelines, Giselles, quem sabe que nome, quem sabe que tempo -, mas distante do agora.
Me deixa acender o lampião, a vela grossa sobre a mesa de madeira bruta, o livro quase incompreensível aberto sobre a mesa, exigindo atenção no silêncio completo dos tempos ainda não tão civilizados.
Me deixa, ao ir para o quarto, tirar a anágua, a armação da minha saia, tantos tecidos, nenhuma lingerie, o corpete que esconde minha pele branca que nunca vê o sol porque isso ainda é grosseiro, nesse tempo do passado ao qual voltamos.
Me deixa deitar-me sobre o colchão tão fofo, o travesseiro de penas, os edredons caseiros. Quero essa sensação do algodão, do natural, do aconchego de outrora.
Me deixa despertar com o canto do galo, sentindo o aroma da terra, dos jasmins em flor, até do esterco, da flor de laranjeira, da madeira da minha casa, teu cheiro tão bruto, teu odor de homem rústico, tua pele sem colônia, teu corpo moldado a ferro, a esforço, a trabalho braçal, sem academia, sem hormônios nada naturais.
Preciso soltar meus cabelos, fazê-los tranças, correr no campo, olhar os céus, te dar dez filhos e encher minha vida dessa sensação de vida tão presente nesse nosso tempo que nunca será futuro, se nos prendermos aqui, neste momento suspenso entre o nada e o começo de tudo.

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