23.7.04

Você tá bem?

Ele me pergunta como foi meu dia e eu me vejo muda porque não sei como lhe responder.

Ele quer saber se estou bem.

Como se fosse fácil contar-lhe que meu dia se faz por dentro, não por fora.

Se fosse responder, lhe diria: "Hoje, declarei uma paixão, defendi uma amiga, lavei a alma duas vezes, senti pesar por outra amiga, identifiquei-me com K. (como sempre), pensei em responder a um e-mail mas achei que só me repetiria, ouvi meu amigo I. dizendo-me que sou sua ídola-madrinha-dos-gays, quase fui até outro estado estrangular a namorada de alguém porque *ela* também escreve tão bem que posso virar sua fã...

Mas nada disso é o que ele deseja saber.
Então: sim, as finanças estão sob controle, já posso sorrir um pouquinho. Sim, tenho trabalhado. Sim, dei gargalhadas com a pequena, quando cantei "Mochila, pantufa, uniforme, calcinha" e ela exclamou: "Mãe! Como é que alguém vai à escola de pantufa? É *caderno*, não pantufa!", mas depois começamos a improvisar na letra da musiquinha do comercial e rimos como loucas. Sim, levei-a à psicóloga, que suspeita que minha pequena não tem TDAH, mas excesso de inteligência. Ah, claro, contei-lhe que a Letícia já se submeteu a avaliação e que, sim, é superdotada e que sim, também sou mas e daí se neste país superdotados têm tão poucos privilégios quanto os desprivilegiados cerebrais?
Então, como a vida (minha) se mede por dentro, e ele é um homem que mede a sua pelo que vem de fora (ou pelo menos não me transmite vôos, mas sempre põe meu pé no chão), em certos dias, quando voei demais, não ouso lhe dizer por onde andei, porque quase posso ouvir um suspiro resignado vindo de lá, como que dizendo: "O que faço contigo, hein?"
Nada. Let me be.
Sei que entendes que às vezes só preciso buscar outras almas que alimentem a minha.
Quando eu voltar para a terra, te procuro...
 

3 comentários:

Anônimo disse...

Hmmmm...
...triângulo identificatório...
(Pq só aquele imbecil vive tbém me perguntando se eu estou bem, como tenho passado "os dias, as horas"?)

Sofi
sofiagaarder.blog.uol.com.br

Anônimo disse...

Não há limite algum em nenhuma palavra a não ser quando a lemos, porque assim ela passou de existência a nebulosidade, de simulação a fingimento. De mim vêm os dragões, as penas, as flechas, o tigre e o urso, e nada de nós, nem dizeres sólidos. Fluxo. Deixa a espada cair. Estou ao lado, regendo palavras... e há sempre uma benignidade em responder as mensagens. Risos. Beijo.

Anônimo disse...

taih, gostei demais. triste, um pouco, mas doce. como gosto.
virei sua fã.
beijo,
carola
http://www.carolinaporto.com/blog/